A invisibilidade feminina tem sido uma constante em nossa sociedade, como se no processo de criação cultural a mesma não participasse, nem se quer existisse.
As histórias dos homens, leia-se: constante exaltação e mérito aos feitos masculinos, tem silenciado o minucioso e ancestral trabalho feminino.
Na oralidade da transmissão, em que a cultura popular se consagra de geração em geração, nomes como Zumbi, Gregório de Matos Guerra, Joaquim José da Silva Xavier, Cícero Romão Batista, Virgulino Ferreira da Silva e Luiz Gonzaga do Nascimento permanecem invictos, mas os nomes das mulheres se dissipam nesse telefone-sem-fio folclórico. Ora, se a cultura popular é fruto do pulsar das pessoas e seus costumes cotidianos que geram assim uma manifestação coletiva comum a TODOS os indivíduos de um povo, uma cultura sem mulher seria o retrato de uma tribo isolada alienígena desconhecida?
Assim como em muitas outras manifestações, a capoeira foi durante muito tempo uma área de reserva masculina, contornada por uma barreira segregativa que atrapalhava a participação das mulheres de forma livre e respeitosa. As mulheres que ousavam atravessar essa invisível barreira social eram, no mínimo, masculinizadas e alvos de brincadeiras pejorativas. Apesar das dificuldades, alguns nomes ecoaram do burburinho escandalizado de uma sociedade pouco acostumadas a ver mulheres em ação.
Maria Doze Homens, Salomé, Catu, Angélica Endiabrada, Almerinda, Menininha, Rosa Palmeirão e Massú são nomes de algumas guerreiras que fazem uma memória mínima, ultrapassando o estigma da fragilidade feminina.
Maria Doze Homens ou Maria Felipa de Oliveira viveu na Bahia durante o século XIX.
Sobre sua vida há atualmente algumas versões distintas.
Há quem diga que Maria Doze Homens viveu em Ponta das Baleias, atual Ilha de Itaparica e recebeu esse nome por ter lutado e vencido 12 homens através da sua habilidade capoeirista.
Existe outra versão sobre sua história que afirma a participação dela no ato de resistência à ocupação dos portugueses em Itaparica, atuando na organização, ajuda dos feridos e batalha, tendo aí matado 12 soldados inimigos.
O fato de não sabermos se a vida desta Maria é histórica ou lendária, exemplifica o quanto a memória de atuação feminina foi desprezada nos momentos do ensino e repasse da cultura, mas implicitamente até os homens que se privilegiam desse registro
machista sabem que há e houveram mulheres tão surpreendentes a ponto de causarem sobressaltos se suas histórias forem de fato relevadas.
Camila Lucena
Graduanda do curso de Lic. em Educação Física - UFRPE